A MINHA RUA
Durante muitos anos o mundo para mim acabava no Sabugal. Fui crescendo e descobri que se queria continuar os estudos tinha que descobrir outro mundo. Esqueci a minha rua e parti à procura do outro mundo. E de facto encontrei outro Mundo.
O outro Mundo é tão grande que me perdi nele e nunca mais vivi na minha rua. Mas sinto saudades da minha rua. É que a minha rua não era só o chão de terra batida, o muro de pedra, os três enormes carvalhos e as casas
Hoje a minha rua já não é a mesma, até o nome lhe tiraram. Eu conhecia-a por Rua do Carvalhão e os três carvalhos serviam de testemunho. Agora, dizem que o meu pai vive na Rua de Braz Carvalhão. Disseram-me que é o nome do dono da última casa lá da rua. A minha rua, a rua do Carvalhão, de tão estreita que era, só passava um carro de vacas e a camioneta tinha que ficar no Camões porque era muito larga. Até o Ti Coxo era obrigado a levar a malhadeira lá pela rua do Cabeço, mesmo que as vacas o não quisessem. As casas de um lado e o muro de pedra do outro obrigavam a estas alterações de tráfego e por vezes as teimosias deitavam as pedras abaixo.
No Verão, depois da escola, a minha rua era o nosso parque infantil. Desde pontapés na bola, jogar ao fite ( malha), à macaca, ao pião e aos feijões, até ao jogo do lenço e fazer corridas de carros de madeira, eu e os meus amigos éramos os donos da rua.
A minha rua era o cheiro da chuva no pó, ou na sua ausência em tempo de Verão, era a Ascensão que se encarregava de regar o pó para ele não entrar pela casa dentro, a manta de farrapos no chão cheia de gravanços a secar ao sol, a minha mãe e a Ti Cilda na varanda.
Por essa altura, o mundo era só do tamanho da minha rua e todas as pessoas que eu conhecia eram ainda vivas. Agora, encontrei estas fotografias velhas e voltei a ser feliz na minha rua outra vez.
Ai se a rua fosse minha, se esta rua fosse minha eu mandava-a ladrilhar...
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