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15.11.23

MALCATA: UM MAGUSTO TRADICIONAL PRECISA DE CARUMA SECA

 

Castanhas assadas sobre a mesa

    Como se preservam as tradições e ao mesmo tempo se defende e fortalece a identidade cultural de uma comunidade, de uma freguesia rural?
    E que importância têm as tradições  e costumes que essa mesma comunidade teima em realizar?
    O reconhecimento da importância das tradições e o continuar com elas, para salvaguardar as tradições do passado e com isso fortalecer a identidade cultural dos malcatenhos, já é um passo certo no sentido de preservar o património imaterial da nossa comunidade. E o património imaterial, vai para além do património material, como é o caso dos monumentos, concretamente, a torre do relógio, as fontes, a igreja matriz, as ruas... Esse é o que chamamos património material, porque são bem visíveis e  estão à vista de todos. Mas o modo de ser, sentir, celebrar os costumes, as tradições, as festas  pagãs e cristãs, a oralidade  e expressões que as pessoas recorrem no dia a dia e durante muitas gerações,  funcionam como bilhete de identidade da comunidade deste lugar de Malcata. É o conjunto destas expressões  e  rituais, transmitidas de geração em geração e que permanecem que valorizam importante todo o património material e imaterial.  Por isso, sempre que se realizam eventos na aldeia, é uma oportunidade para os malcatenhos conhecer  a relação que temos com a nossa história como povo, sendo por isso importante cimentar as relações entre as pessoas e o fortalecimento do sentimento de pertencer a este povo.
    A tarefa de preservar o nosso património deve ser assumida por todos e não apenas pelas associações ou pela Junta de Freguesia. Cada um de nós deve preocupar-se por olhar para o património como seu e que o  deve manter e preservar, divulgar a quem deseja conhecer. Contudo, cabe às instituições públicas o dever de fazer um esforço maior e preservar esses tesouros e contribuir para uma melhor compreensão e um maior interesse em preservar a história, a tradição e costumes, um legado que nos deixaram aqueles que nos antecederam. 
    O facto de se organizarem eventos como os magustos, que anualmente se organizam, não significa imediatamente que estamos a preservar uma tradição ou os costumes da nossa aldeia.
     Preservar uma tradição exige muito mais que um mero convívio durante uma tarde. A envolvência da comunidade, a utilização das ferramentas e dos métodos tradicionais e não trocar esses rituais por modas novas, ou outras ferramentas,  mais rápidas e práticas, como é a utilização do assador que veio substituir o monte de caruma e todos os passos necessários a promover um magusto tradicional, deve ser tido em conta. A verdadeira tradição e um magusto tradicional é ir aos pinhais buscar caruma seca, fazer o monte e nele deitar as castanhas e esperar que o fogo as asse, no ritmo próprio e não apressado. O assador tem vantagem em relação ao monte de caruma, sem dúvida, desde a maior quantidade de castanhas que se podem assar ao mesmo tempo, á rapidez em que é feito e com menos trabalho.
     E a tradição esquece-se? O magusto está a ser tomado pela modernice deste assador e que mais não é do que uma réplica do assador de outra aldeia vizinha. Com a introdução deste super assador de castanhas, a tradição de as assar  no monte da caruma, num largo ou numa rua, está a esfumar-se das memórias e vivências dos mais jovens e a tradição deixa de existir. Os cheiros e os fumos da caruma a arder e castanhas a assar, são rituais que não se podem substituir pelo uso de grandes assadores. Estes grandes e super assadores são mais indicados para assar carnes e até castanha, mas nunca para celebrar e preservar o magusto tradicional.
    O facto de conviver e comer castanha assada, não significa que se trata de um magusto tradicional, é apenas uma tentativa de recriar a tradição popular, tão banal como ligar um forno lá de casa.

    Quando as pessoas se reúnem para celebrar a tradição do magusto, respeitar a forma tradicional de assar castanhas é fundamental. Isto é, se o objectivo for reviver um magusto à antiga! E se a estes cuidados de respeitar as tradições, seja do magusto ou da matança, juntarmos a participação de pessoas vindas de fora, visitantes que buscam experiências genuínas e rurais, que procuram  sabores diferentes e só existentes no campo, estamos a criar valor acrescentado e a promover o desenvolvimento sustentável da nossa aldeia e das nossas gentes. Porque organizar convívios na nossa aldeia até  tem sido muito fácil e  há sempre quem apareça. Agora organizar eventos com o objectivo de preservar e mostrar o valor das tradições e vivências rurais, respeitando a história, as pessoas ainda vivas, as tradições, já é coisa bem diferente e necessita de mais cuidados na sua realização.
    Há ainda um trabalho por realizar no que toca ao nosso património imaterial que se quer preservar e através disso, ter em mente o desenvolvimento sustentável da nossa freguesia e do modo de vida dos que vivem todo o ano nela. Cativar as pessoas de fora para conhecer a aldeia, as pessoas, os monumentos, os recursos naturais únicos e raros, cuja qualidade e riqueza da experiência levam as pessoas a percorrer centenas de quilómetros para vivenciar dias diferentes. O hábito de organizar eventos que apenas se dirigem aos malcatenhos, é não acreditar no valor do que temos na freguesia. Organizar também estes convívios para as pessoas de fora pode funcionar como alavanca de desenvolvimento dos negócios locais. É uma das estratégias que devemos adoptar na nossa aldeia para a dinamizar. E com tantos dias que tem o ano, com tantas tradições que merecem ser promovidas, haverá sempre convívios voltados para aqueles que vivem sempre neste paraíso malcatenho.

                                                 José Nunes Martins



 

13.11.21

AS CASTANHAS E OS CANIÇOS

 

Os segredos de assar castanhas

  Os dias de hoje já são diferentes de antigamente. A época que estamos a viver que envolve a apanha das castanhas é vivida de forma diferente dos anos 60 ou 70. Nas aldeias onde havia castanheiros, por esta altura do ano, viviam-se momentos de alegria e festa. Em Malcata ainda há bons castanheiros que nos fazem recordar outras tradições que o povo vivia. Mesmo as pessoas que não tivessem castanheiros, não ficavam sem as castanhas. Depois da apanha das castanhas vinha o tempo do “rebusco”. Durante esses dias toda a gente tinha o direito de ir apanhar castanhas onde as houvesse, sem receio de ser repreendida ou acusada de roubo.
  Nesta altura do ano juntavam-se aos grupos de amigos, de vizinhos ou famílias e faziam o magusto, por vezes faziam a fogueira mesmo no meio da rua ou dos largos da aldeia. Não faltava castanha assada com caruma e uma copa de jeropiga para ajudar a empurrar.
  Mas a castanha nesses tempos de miséria tinha um importante lugar na alimentação. Então havia que guardar e poupar para ter castanha durante todo o ano. Durante o tempo frio e neve, nada como pegar num punhado de castanhas e metê-las num púcaro com água e deixá-las cozer para comer, para juntar ao caldudo, muitas vezes a refeição mais forte do dia.
   E para guardar as castanhas durante tanto tempo, os meus pais despejavam-nas no caniço que havia por cima da lareira. Os caniços não era mais do que um estrado de varas direitas e suspensas horizontalmente, mantendo-se afastadas entre elas, mais ou menos um centímetro, a distância suficiente para não deixar furar as castanhas e elas caíssem no chão da cozinha ou em cima da cabeça de alguém. O caniço enchia-se com as castanhas e ali permaneciam a receber o calor do lume até ficarem secas e rijas. Dali iam para um cesto de vergas, o meu pai calçava os tamancos e entrava para dentro do cesto baloiçando o corpo e os pés até a casca sair. O par de tamancos eram especiais e estavam preparados para executar a tarefa de descascar a castanha, que por estar seca e dura, os cravos que preenchiam toda a sola do tamanco, por muito aço que tinham, apenas retiravam a casca às castanhas. Após o tempo da dança dos tamancos, a minha mãe chegava com uma saca de pano para a encher e guardar num lugar seco lá de casa até que um dia chegasse a oportunidade de fazer um daqueles caldudos.
  As pessoas da minha idade, provavelmente como acontece a mim, também se recordam destas coisas de antigamente. Será que ainda existem caniços na aldeia?
  Vivemos num mundo cheio de inovações e de tecnologias.  Tenho orgulho das minhas origens e para mim, escrever estas memórias que eu vivi, são uma singela homenagem a toda essa gente boa da nossa aldeia, que mesmo não entendendo de computadores e telemóveis, nem andam pelas redes sociais, têm segredos e saberes que os ajudaram a viver. Saibamos nós encontrar formas de guardar todas estas memórias e sabedoria dos nossos avós e pais. Dar maior atenção e importância ao espólio e às tradições mais antigas, para que as gerações presentes e futuras nunca esqueçam as suas raízes, é o mínimo que podemos fazer.

Nota: Dia 13 de Novembro vai ter lugar o Magusto 2021, na Associação Cultural e Desportiva de Malcata. Os meus desejos são de que seja uma tarde de festa e são convívio.



5.11.21

CASTANHAS QUENTES E BOAS

 


   CASTANHAS
   QUEM QUER QUENTES E BOAS?

   A castanha já teve mais importância na alimentação de muitas famílias de Malcata. Noutras épocas, a nossa terra orgulhava-se dos castanheiros e da qualidade da castanha. Eram árvores adultas, de tronco bem grande e uma copa que ia até aos 30 metros de altura. O castanheiro, sempre foi e continua a ser, uma espécie de árvore que dadas as suas características e o seu desenvolvimento, não é espécie de árvore para o jardim de casa, mas que muitas pessoas não se importariam de ter perto. A sua copa frondosa nos dias de calor fascina qualquer amante da sombra.
   No Outono, as folhas amarelecem e os ouriços mudam dos tons verdes para acastanhados. São os sinais da aproximação da apanha da castanha longal, judia, negral, martainha ou avelã, conforme a variedade que a árvore produz.
   Eu gosto de castanha assada. Mas há pessoas que gostam mais de castanha cozida, seca ou pilada, na sopa ou em caldudo, num assado de carne com batata assada e castanha, ou seja, é um alimento muito versátil na cozinha.
   A castanha assada pede um acompanhamento de jeropiga, água-pé ou vinho do Porto. Dizem que se digere melhor!
   Lembro aqueles magustos que se faziam na escola primária e também pelas ruas da aldeia. Com a caruma e as castanhas no meio, deitava-se o lume e esperava-se que assassem as castanhas.  Eram tardes alegres e a criançada brincava ao redor da fogueira e entre duas ou três castanhas assadas, molhava-se a garganta, enfarruscava-se o amigo, o avô ou o pai...uma enfarruscadela não fazia mal e não podia faltar!
   Eu cresci a ver castanheiros por todos os sítios da aldeia. Hoje a paisagem é diferente e esses velhos castanheiros desaparecem e como já são velhos, há que deitá-los abaixo. Esquecemo-nos com muita facilidade os tempos em que davam muitas e boas castanhas.  E elas, as castanhas, são hoje apreciadas como sempre foram. É um fruto que faz bem ao nosso organismo, tem é que se consumir com moderação.
   Boas lembranças...
   Quem quer quentes e boas?
   Quentes e boas!
                             José Nunes Martins