MALCATA: UM MAGUSTO TRADICIONAL PRECISA DE CARUMA SECA

 

Castanhas assadas sobre a mesa

    Como se preservam as tradições e ao mesmo tempo se defende e fortalece a identidade cultural de uma comunidade, de uma freguesia rural?
    E que importância têm as tradições  e costumes que essa mesma comunidade teima em realizar?
    O reconhecimento da importância das tradições e o continuar com elas, para salvaguardar as tradições do passado e com isso fortalecer a identidade cultural dos malcatenhos, já é um passo certo no sentido de preservar o património imaterial da nossa comunidade. E o património imaterial, vai para além do património material, como é o caso dos monumentos, concretamente, a torre do relógio, as fontes, a igreja matriz, as ruas... Esse é o que chamamos património material, porque são bem visíveis e  estão à vista de todos. Mas o modo de ser, sentir, celebrar os costumes, as tradições, as festas  pagãs e cristãs, a oralidade  e expressões que as pessoas recorrem no dia a dia e durante muitas gerações,  funcionam como bilhete de identidade da comunidade deste lugar de Malcata. É o conjunto destas expressões  e  rituais, transmitidas de geração em geração e que permanecem que valorizam importante todo o património material e imaterial.  Por isso, sempre que se realizam eventos na aldeia, é uma oportunidade para os malcatenhos conhecer  a relação que temos com a nossa história como povo, sendo por isso importante cimentar as relações entre as pessoas e o fortalecimento do sentimento de pertencer a este povo.
    A tarefa de preservar o nosso património deve ser assumida por todos e não apenas pelas associações ou pela Junta de Freguesia. Cada um de nós deve preocupar-se por olhar para o património como seu e que o  deve manter e preservar, divulgar a quem deseja conhecer. Contudo, cabe às instituições públicas o dever de fazer um esforço maior e preservar esses tesouros e contribuir para uma melhor compreensão e um maior interesse em preservar a história, a tradição e costumes, um legado que nos deixaram aqueles que nos antecederam. 
    O facto de se organizarem eventos como os magustos, que anualmente se organizam, não significa imediatamente que estamos a preservar uma tradição ou os costumes da nossa aldeia.
     Preservar uma tradição exige muito mais que um mero convívio durante uma tarde. A envolvência da comunidade, a utilização das ferramentas e dos métodos tradicionais e não trocar esses rituais por modas novas, ou outras ferramentas,  mais rápidas e práticas, como é a utilização do assador que veio substituir o monte de caruma e todos os passos necessários a promover um magusto tradicional, deve ser tido em conta. A verdadeira tradição e um magusto tradicional é ir aos pinhais buscar caruma seca, fazer o monte e nele deitar as castanhas e esperar que o fogo as asse, no ritmo próprio e não apressado. O assador tem vantagem em relação ao monte de caruma, sem dúvida, desde a maior quantidade de castanhas que se podem assar ao mesmo tempo, á rapidez em que é feito e com menos trabalho.
     E a tradição esquece-se? O magusto está a ser tomado pela modernice deste assador e que mais não é do que uma réplica do assador de outra aldeia vizinha. Com a introdução deste super assador de castanhas, a tradição de as assar  no monte da caruma, num largo ou numa rua, está a esfumar-se das memórias e vivências dos mais jovens e a tradição deixa de existir. Os cheiros e os fumos da caruma a arder e castanhas a assar, são rituais que não se podem substituir pelo uso de grandes assadores. Estes grandes e super assadores são mais indicados para assar carnes e até castanha, mas nunca para celebrar e preservar o magusto tradicional.
    O facto de conviver e comer castanha assada, não significa que se trata de um magusto tradicional, é apenas uma tentativa de recriar a tradição popular, tão banal como ligar um forno lá de casa.

    Quando as pessoas se reúnem para celebrar a tradição do magusto, respeitar a forma tradicional de assar castanhas é fundamental. Isto é, se o objectivo for reviver um magusto à antiga! E se a estes cuidados de respeitar as tradições, seja do magusto ou da matança, juntarmos a participação de pessoas vindas de fora, visitantes que buscam experiências genuínas e rurais, que procuram  sabores diferentes e só existentes no campo, estamos a criar valor acrescentado e a promover o desenvolvimento sustentável da nossa aldeia e das nossas gentes. Porque organizar convívios na nossa aldeia até  tem sido muito fácil e  há sempre quem apareça. Agora organizar eventos com o objectivo de preservar e mostrar o valor das tradições e vivências rurais, respeitando a história, as pessoas ainda vivas, as tradições, já é coisa bem diferente e necessita de mais cuidados na sua realização.
    Há ainda um trabalho por realizar no que toca ao nosso património imaterial que se quer preservar e através disso, ter em mente o desenvolvimento sustentável da nossa freguesia e do modo de vida dos que vivem todo o ano nela. Cativar as pessoas de fora para conhecer a aldeia, as pessoas, os monumentos, os recursos naturais únicos e raros, cuja qualidade e riqueza da experiência levam as pessoas a percorrer centenas de quilómetros para vivenciar dias diferentes. O hábito de organizar eventos que apenas se dirigem aos malcatenhos, é não acreditar no valor do que temos na freguesia. Organizar também estes convívios para as pessoas de fora pode funcionar como alavanca de desenvolvimento dos negócios locais. É uma das estratégias que devemos adoptar na nossa aldeia para a dinamizar. E com tantos dias que tem o ano, com tantas tradições que merecem ser promovidas, haverá sempre convívios voltados para aqueles que vivem sempre neste paraíso malcatenho.

                                                 José Nunes Martins



 

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