O mês de Abril tem
sido bastante chuvoso, com ventos fortes nos montes e grande ondulação no mar. Neste
Sábado de Aleluia o sol já deu um pequeno ar da sua graça. Agora mesmo, ouço a
água da chuva a bater com força nas vidraças das janelas, um final de dia
bastante invernal. Para assustar só falta ouvir os trovões.
Lembra outras Páscoas que passei na
aldeia, com muita chuva e relampejos que assustavam toda a gente. Na Páscoa, as
pessoas , mesmo as que estavam longe, apareciam na aldeia para assistir às
cerimónias religiosas e passar o domingo de Páscoa com a família.
A Páscoa era antecedida da quaresma e os três
dias anteriores ao Domingo da Ressurreição, eram vividos como se estivéssemos a
participar num funeral, com cantos e rezas tristes, as pessoas andavam os dias
mais recolhidas, com roupas escuras sobre o corpo, de lenço preto na cabeça e
xailes pretos, todas as mulheres eram iguais, dificultando imenso saber-lhes os
nomes sem falar com elas.
As minhas lembranças de criança
guardo-as como se fossem um filme a preto e branco, das cerimónias dos Passos
do Senhor e da Procissão do Enterro do Senhor, que despia por completo o
interior da igreja paroquial. Não ficava um santo, todos eram retirados e a luz
das velas criavam um ambiente que a mim me metia medo. Detestava o som das
matracas, aquilo não era nada bom de ouvir, nada a ver com o som dos sinos, mas
o sacristão estava proibido de subir ao campanário, tinha que andar a tocar as
matracas, os sinos só depois da missa da Aleluia, a missa da vigília pascal, em
que levávamos para a missa campainhas e chocalhos para fazer barulho assim que
o senhor prior desse o sinal lá do altar! Aquilo sim, campainhas e chocalhos,
sinos e sinetas anunciavam a Vida, a Ressurreição e cantava-se Aleluia,
Aleluia.
Os rapazes, no final da missa de Sábado
de Aleluia, corriam para o campanário e esperavam a sua vez de agarrar nos dois
badalos e tocar os sinos até dar a vez a outros. O tocar dos sinos da igreja
era a forma mais audível de anunciar a Ressurreição, a vitória da Vida sobre a
Morte.
Nas minhas memórias de infância não se
encontram cenas da Visita Pascal ou do Compasso. Essa tradição que, é antiga em
muitas terras, na nossa aldeia não assisti e penso que nunca fez parte das
celebrações da Festa da Páscoa. Mas a propósito do Compasso ou da Visita Pascal,
tenho
lembranças de um Domingo de Páscoa em que vesti a batina e com mais dois homens
que me acompanharam, durante o dia entrámos nas casas das pessoas desejar boas
festas. E lembro-me que o homem da cruz, a certa altura, já o dia ia a meio,
saiu-se com estas palavras para mim: “Ó sr. Padre,
tenha cuidado porque pode tombar”. E em minha defesa veio o dono da casa e
disse: “Parece-me que ali o Manel Coxo já não se equilibra lá muito bem! Olha
se tendes que ir todos ao balão…
De facto o homem já andava com alguma
dificuldade e às vezes notava que ele perdia o equilíbrio, mas ele replicou e
disse:
_ Ó Kim, fica tranquilo e descansado porque eu já sou coxo há muitos anos…
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