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Rua do Carvalhão em 1994 |
Só quem mora longe
do lugar
que sempre gostou, é que sente saudades. Quem está fora continua a levar a sua
vida da forma que melhor é capaz. E andamos meses e semanas a pensar naquele
dia em que, faça chuva ou sol, rumamos em direcção ao nosso pequeno mundo
secreto e ao qual pertencemos. Foi nesse pequeno cantinho do mundo, longe do
mar e perto da floresta, que a nossa vida começou. É nessa pequena aldeia
serrana, protegida dia e noite dos ventos que sopram do lado da Espanha, que
por amor,
pela água fresca, pela liberdade que se vivia, muito afastados das preocupações
que muitas famílias tinham que ultrapassar, sempre com todos os cuidados e
cumprindo todas as leis do regime, que as frágeis árvores que nós eramos, se
agarraram à terra e cujas raízes nos mantêm
para sempre ligados e agradecidos.
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Os meus dois amigos fieis |
Vivemos com essa
ideia de chegar aquele dia em que nós regressaremos. E o que parece fácil e
rápido de resolver, demora anos a concretizar esse desejo. E de todas as dores
que uma pessoa pode sentir, as da alma são aquelas que custa mais a passar. Não
sei se convosco acontece o mesmo, comigo é duro e difícil. E talvez seja por
sentir o que sinto que guardo em casa tudo o que se identificar com a aldeia
onde nasci e que cada vez estou a visitar menos.
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Rua da Moita |
Eu sei que é uma aldeia igual ou pelo menos, com muitas parecenças a outras aldeias do nosso país, do nosso concelho.
A vida é feita de mudanças. E o nosso mundo responde e abre as suas janelas para sermos criativos, trabalhadores e ainda arranjar tempo para contemplação. Esse cantinho da aldeia, na rua com carvalhos gigantes e figueiras de figos lambões, numa casa sem electricidade, sem água nem torneiras, com uma loja cheia de vivo e dois porcos no cortelho por baixo das escaleras, nasci eu, João, na Rua do Carvalhão e um mês depois registado com nome de José. Um dia conto esta história de fio a pavio. Sei que há estórias bem piores!!!
Saúdo todos aqueles que, tal como eu, optaram por conhecer mais mundo, caminham por estradas e céus bem distantes e que às vezes apanham uma ensaboadela por terem vergonha de se apresentar e revelar as suas origens. O trabalho, a resistência e algumas réstias de brutalidade beirã, que vem e faz parte das características dos beirões, inconscientemente, funcionam muitas vezes como os códigos de barras ou dos dados biométricos e não vale a pena esconder. Somos malcatenhos.
José Nunes Martins