NINGUÉM SE SALVA SOZINHO
Viver a vida a pensar nos outros
O entardecer volta
a cobrir a minha vida e recordo-me das trevas e do silêncio ensurdecedor, um
vazio dentro de mim que não me deixava olhar sequer para o céu e isso ninguém
viu porque estavam todos fechados nas suas casas porque a tempestade
era demasiado forte, inesperada e furibunda. Desorientei-me, as lágrimas não me
deixavam ver o caminho e à porta do cemitério eramos cinco à espera de uma
pessoa que não aguentou mais tempo confinado ao seu quarto, sem visitas, só
entrava quem cuidava do seu corpo, porque a alma já a tinha oferecido aos que o
amavam.
Sempre respeitei a sua autonomia e a
sua liberdade. Não lhe impus aquilo que eu pensava que seria o mais adequado
para ele. Mas os decretos do Governo definiram que quem tivesse atendimento
hospitalar e lá passasse a noite, regressava e tinha que ficar isolado dos
outros utentes do lar. Nesse mês de Março de 2020, as missas eram proibidas e
os funerais obedeciam a regras nunca antes decretadas. Os senhores da política
até decretaram o número máximo de pessoas que podiam acompanhar os cortejos
fúnebres e entrar nos cemitérios. Tudo porque não se podia fazer ajuntamentos
de muitas pessoas. Como as missas estavam proibidas, os velórios deixaram de se
realizar. As empresas funerárias encarregavam-se de todos os procedimentos
necessários, cumprindo as determinações da Direcção Geral de Saúde.
Tinham o trabalho de ir aos hospitais e transportavam as urnas bem seladas
directamente para o cemitério, onde os familiares mais chegados (máximo de 10)
aguardavam a chegada, mantendo entre eles a distância que as autoridades
aconselhavam. Sem grandes cerimónias, o Pe. Eduardo depois das orações e de
umas breves palavras de aconchego, foi apressado para outro cemitério.
Vivíamos todos em estado de emergência.
Todos corriam o risco de ser apanhados de surpresa pelo vírus. A vida e a
sociedade não estava preparada para tanto, ninguém estava habituado a sentir
medo do presente e dos dias a seguir.
Cada um penso que cumpriu o seu dever,
mesmo aqueles que lhes foi imposto. E assim ajudámos o nosso país a levantar a
cabeça. O mundo que quase parou, voltou ao seu habitual.
Hoje, 29 de Março de 2024, estamos
novamente a reflectir na morte de Jesus Cristo.
Estamos todos no mesmo barco e a nossa
fragilidade mostra-nos a falta das palavras do Mestre da embarcação “Não
tenhais medo”. Somos chamados a remar juntos e confiar no nosso mestre para chegar
a porto seguro.
José Augusto Martins |
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