CEGOS, SURDOS E MUDOS
A aldeia de Malcata à medida que cresceu as casas foram-se
espalhando por cabeços, moitas, tapadas e barreirinhas? Se virmos a aldeia do
alto ficamos com essa sensação. As pessoas quando se casavam, procuravam arranjar
casa. Os primeiros habitantes começaram por ocupar os espaços mais próximos uns
dos outros e com o crescimento do número de pessoas, as ruas começaram a
ligar-se umas às outras, mantendo o nome que já lhes chamavam a esses sítios. A
rua da Ladeirinha, rua da Moita, rua do Cabeço, Rua da Barreirinha, Rua da
Tapadinha, Rua do Carvalhão. Todos estes nomes são os próprios topónimos pelos
quais o povo os conheceu e conhece hoje? Tudo leva a crer que assim foi e
manteve-se durante muitos anos.
Geralmente as igrejas das aldeias
portuguesas desenvolvem-se em volta da Igreja Paroquial ou alguma capela. No
caso da aldeia de Malcata isso não aconteceu e continua a não aumentar a
edificação à volta da igreja Matriz, nomeadamente nos terrenos que se situam
atrás da sacristia. Eu só encontro uma explicação para esta singularidade da
nossa aldeia, que muito cresceu e em contraposição aos costumes das outras
terras, não se constrói nos campos que estão ali ao lado. Esses terrenos, chãos
e lameiros, eram de boa terra para a agricultura e para o pasto dos animais.
Por ali me lembro de ver bons campos de batatas, de milho, de centeio e
verdejantes pastagens, lameiros como lhe chamamos na nossa aldeia. Esta
característica relacionada com a qualidade das terras e o tipo de ocupação, terá
sido tão forte que ninguém ousou construir por ali uma casa para morar? É uma
particularidade que se pode constatar quando por ali alguém passar, à esquerda
e à direita um vale extenso e plano, subdividido em campos delimitados por
muros e arvoredo.
Outra estranheza e particularidade da malha
urbana da nossa aldeia e no que respeita ao nome das ruas, estranhamente, não
existe uma rua com o nome de rua da igreja ou rua do cemitério. Mais um motivo
para pesquisar as ruas da aldeia, que infelizmente,
a cada ano que passa, aumenta o número de casas vazias, acabando por ir caindo
aos poucos. Algumas já foram recuperadas e outras ainda estão a ser.
Aqui há que fazer uma pausa e
perguntar se aquilo que não vemos ou não ouvimos falar não existe? Muitos dos
habitantes da aldeia passam todos, ou quase todos os dias, numa determinada rua
ou beco. Caminham lestos ou devagar e só olham para a frente e nada de
distrações. Eu sempre que caminho pelas mesmas ruas e becos, olho em todas as
direcções e por vezes, vejo cada fenómeno! Desde mamarrachos, telhados que já
não abrigam nada, paredes “grávidas” e outras sem barro e com pedras soltas,
uma casa vazia, com portas e janelas entreabertas e a cair de podridão, muros
de cimento colados às paredes de pedra de xisto, outros muros pequenos, que não
descansaram até se encostar às pedras de granito trabalhado e que passaram de
elemento principal a pedras vulgares, sem importância nenhuma, esquecendo que
antes do muro e do cimento, já elas, as pedras, embelezaram o sítio. Quem as
abandonou e as despromoveu continua a não se interessar por lhes dar uso, devolvendo
a importância e o respeito que elas merecem e o património comum exige.
Acreditem, se houvesse o prometido
orçamento participativo, uma das ideias que eu sugeria seria a compra de alguns
pares de óculos para os autarcas da nossa freguesia e fazer aprovar uma regra
de obrigatoriedade do uso desses óculos, no mínimo, uma vez por mês, quando o
trio fazia a verificação atenta do estado da coisa comum em Malcata.
PS: Esta é uma opinião pessoal. Qualquer situação aqui retratada é pura imaginação minha e se alguém pensar que lhe diz respeito, é uma simples coincidência.
José Nunes Martins
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