É PRECISO MAIS DO QUE A BELEZA NATURAL
Ainda me passou pela minha cabeça que, com a mudança de equipa na autarquia, a chegada de gente jovem, as coisas começassem a levar-nos para um futuro diferente. A realidade está à vista de todos e ainda nos falta muita informação sobre o que não está assim tão perto. Daí que...
Uma caminhada em passo lento pelas ruas da nossa aldeia ou por becos e travessas
dá para observar muitas coisas e fico com vontade de escrever sobre aquilo que
vejo.
E o que mais predomina é um silêncio
longo, apenas perturbado pelos voos rasantes e livres das andorinhas. E junto
com os silêncios e as andorinhas vejo paredes de antigas casas em derrocada
desregulada, talvez forçada pelas raízes dos sabugueiros e carvalhos que ali
vivem e se ocupam das manjedouras de outros animais.
Na rua principal da aldeia abundam
abusos e o cimento agora já não consegue disfarçar o abandono a que isto chegou.
Se numas paredes era preciso para dar um ar de habitação cuidada e habitada,
sobram colheradas em escadas e paredes que já tiveram escaleras. Bem, ao menos
este mês deu-lhes para lavar a cara e a sede da nossa freguesia que bem fica
vestida novamente de branco! Oxalá a Fonte Velha seja a próxima a beneficiar
obras de restauro, porque a cara tem mesmo que ser mais bem cuidada. Por muito
bonito que aquele lugar é, como ele se encontra, nem as andorinhas ali vão
beber da água. E mesmo com árvores e copos que com todo o gosto as recebem,
tanto desleixo é sinal de desinteresse e sendo assim, os beirais são mais
práticos para criar família. São as andorinhas e sou eu que esperamos um dia, dentar
no banco e à sombra da pérgula descansar, mesmo que por breves momentos, as
pernas e a cabeça. Mesmo com a Fonte de Mergulho ali ao lado, não convida a
descer aquela catacumba moderna e cinzenta, não é natural e à vista de toda a
gente é que ela gostava de estar. Lá onde ficou, foi onde se criou, mas os seus
anos fizeram sentido enquanto esteve descoberta, todos a viam e dela se serviam,
gostavam de lá ir encher os cântaros, até as vacas, os burros que de nabos não
tinham nada, só de nome e tanto eles trabalharam, puxaram mais cargas de milho
e aguentaram a vagarosa vaca leiteira, sem nunca deixarem de ser burros.
Eu não conheci a fonte de chafurdo, que à
fonte de mergulho também lhe chamavam fonte de chafurdo! Alguém que tenha
paciência e quem sabe venha aqui explicar a origem e as razões de lhe chamarem
a esta fonte, a Fonte de Chafurdo!
E já que está com as mãos na massa, pode também, se souber é claro, contar-nos
a história desta fonte.
E como as crises vêm, na Fonte Velha
tenho saudades do Minimercado a Fonte e de ser sempre bem servido. Ainda hoje gosto
de usar aquelas facas pequenas que lá comprei. Foi um sonho e cá para mim, aquela
história que venderam e que muitos acreditaram vir a ganhar com o futuro
hospital, provocou alguns danos colaterais neste e noutros negócios. Mas isto
são contas de outro rosário. Ainda não foi bem rezado, mas a fé é inabalável e
a sua história um dia será do conhecimento de todos.
E como a estrada me apareceu limpa,
sem regos e altinhos de cimento para desviar a água das chuvas, ao caminhar em
direcção ao poeta da pala num dos olhos, aquele olhar do lince quase me faz
cair. Mas à medida que me aproximo cada vez mais do poeta e do bicho gato, fico
tranquilo porque vejo que um é cego e o outro tem um cadeado que o prende da
boca à pedra de cantaria que ali espetaram. Agora a aldeia também pode exibir a
sua arte urbana. A terra que tem a serra com o mesmo nome, passou a estar
presente na rota da arte urbana e dizem que é mais um ponto a favor da aldeia e
mais um motivo para as pessoas visitarem a nossa aldeia. Poesia e pintura é
arte, é cultura e quem não gosta, tem bom remédio, deixa na borda do seu prato.
Olha o que eu agora me lembrei de escrever, mas eu estava só a fazer uma
caminhada pela rua principal da nossa aldeia. Bem, vou terminar neste ponto e
um dia destes continuo a caminhada. Preciso de parar para descansar os pés. Vou
sentar-me numa das cadeiras da esplanada do Café Camões, ser bem servido e saborear
um bom café. Entretanto, vão olhando para estas imagens e quem sabe tenham alguma ideia de mudar a situação!
José Nunes Martins
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