MALCATA: O QUE É PRECISO PARA SER MALCATENHO?
Já gostei mais de ir à minha aldeia. As últimas vezes tenho vindo de lá com vontade de não voltar tão cedo. Era costume nas vésperas da ida andar entusiasmado e ansioso por chegar o dia da viagem. E depois de lá estar, não me apetecia pensar no dia do regresso à cidade. Agora, basta uns dias na terra e na casa onde nasci para ter vontade de meter tudo na carrinha vermelha e não voltar.
É estranho este sentimento e tenho andado a reflectir nas causas que estão a influenciar este afastamento e distanciamento. É verdade que não gosto de muitas situações com que me deparo quando estou na aldeia. Entristeço-me quando caminho por algumas ruas e reparo no número de casas vazias, com telhados podres e telhas partidas, outras têm janelas de madeira sem vidros, portas de madeira entre-abertas e com um monte de pedras que não deixam sequer entrar na loja. O perigo maior vem dos beirais dos telhados mais antigos, onde as telhas e lascas podem deslocar-se e colocar em perigo a segurança de animais e pessoas que ali passam. E que tristeza me dá olhar para as borradas cinzentas para segurar as pedras de xisto ou substituir telha antiga por chapas vermelhas, que protegem a casa da chuva, mas de belo nada têm. Talvez por isso lhes chamam“subtelha sandwich”, tipo comida rápida, chamada de “comida de plástico”, muitos gostam e outros dispensam, preferindo produto original, da região, feita de bom barro e não de chapa pintada.
São estas coisas que me entristecem. E outras coisas parecidas a estas, que por serem antigas, quando é para mexer nelas, escolhem o modo mais fácil e mais rápido. É deles e os donos é que sabem, são eles que escolhem e decidem como querem fazer a reparação, a substituição do telhado, da porta ou segurar as paredes barrigudas. E se é para fazer, então quanto mais depressa e mais económico melhor. E eu, nascido na aldeia e com mentalidade de cidade, digo a minha opinião, escrevo, publico fotografias, pergunto, critico e sugiro alternativas.
Uns aplaudem, outros mandam bocas quando passo na rua e juntam-se aos que se acham donos de tudo e da aldeia. Mesmo que eu tenha liberdade de pensar e escrever, dizem que me devo calar, deixar andar, não me incomodar com o que os outros fazem, deixá-los andar já que não é da minha conta e responsabilidade.
É por estas afirmações que já me começo a sentir estrangeiro na aldeia onde nasci e vivi, que também foi onde viveram os meus pais. Quando me dizem que eu “já não és de cá, és do Porto, vai mas é para a tua terra”, ou “só prejudicas a terra, não gostas disto”, “olha, tudo o que dizes a mim entra a 100 e sai a 1000”, ou esta assim “quando tu nasceste, eu já comia feijão! A ti já eu te conheço!”
Serei o único a ser assim tratado ou existem por aí mais pessoas assim?
É que se eu for o único, o indesejado e inimigo da aldeia, considerado assim por escrever o que penso, sinto e falo à cerca das ruas, das casas, da água, da luz, das calçadas, das fontes, das rampas, das praias e das piscinas, das multas e das obras, das festas e do passado, do presente e do futuro...se me demonstrarem que eu sou o único a pensar assim, só me resta uma escolha, mesmo que difícil. Primeiro que tudo quero que me digam claramente se vivem no paraíso e eu sou aquele “diabo” que gosta de inventar e fomentar divisões, mal-entendidos e guerras. Quando uma pessoa é hostilizada e marcada como inimiga e má pessoa e no seu íntimo ela se sentir bem consigo mesma e com Deus, o que fazer então?
José Nunes Martins
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