24 abril 2012

O GUARDADOR DE CABRAS

   Ti Horácio, pastor de cabras


A Primavera traz aos campos da aldeia de Malcata as cores das papoilas, das giestas, do rosmaninho, mas não consegue esconder o mal feito por um Inverno frio e seco.
   O sol já quase abalou, está um vento frio e Ti Horácio deita os olhares para a pequena capela de São Domingos, ao mesmo tempo que a mão direita tira a boina da cabeça que uns segundos depois volta a tapar-lhe a cabeça. Continua a sua vida e olha para a nuvem de poeira provocada pelas cabras que regressam do Ozival para casa, depois de um dia inteiro a pastar.
   - Nem no Verão elas levantam tanta poeirada! Nem no Verão isto está tão seco! Desabafa o Ti Horácio, um pouco irritado.
   As cabras andaram desde manhã nos campos e nos caminhos à cata de mato e pequenas ervas. Mas nem as mais novas tiveram grande sorte e o pastor lança mais um desabafo:
   - Ouve João, por esta altura do ano, era para andarem aos saltos além pela serra, a encher o bandulho. Mas este ano, a falta da água é tanta, que não há comida suficiente.
   Quando o rebanho chega à Rua de Baixo, apressam mais o andar e não se enganam quando passam pela Torrinha, pois tal como se tivessem um GPS incorporado no corpo, iniciam a descida da Rua do Carvalhão e só param na loja do dono. Entram aos empurrões e atropelam-se umas às outras para apanhar o feno e a ração que a Ti Ana momentos antes já tinha espalhado pelo chão. Vêm com fome e comem até que começa a ordenha. De balde na mão e tendo já a primeira cabra pronta, inicia a tarefa de encher a vasilha de leite. E sem parar diz-me:
   - Este ano não estou a ver como vou continuar a alimentar o gado. O feno que guardei do ano passado já acabou. Cada fardo custa-me quatro euros, quando o normal é custar dois euros e meio. O leite cada vez é mais despesas e menos leite! Como é que posso acordar de cabeça erguida? Eu já disse à minha mulher que mais valia vender as cabras. Afinal, já não há quem queira ajudar, estas são uma raça boa, da charnequeira, mas como as coisas estão, não sei se as vou manter durante mais tempo.
    E foi mesmo o que aconteceu, vendeu-as ao Ramalhas, proprietário da quinta ali à entrada da aldeia.