2.4.21

MALCATA: MEMÓRIAS E RAÍZES

  

 

 

                 MALCATA:  MEMÓRIAS E RAÍZES DA IDENTIDADE

  




   A Sexta Feira Santa era a noite mais triste do ano em Malcata. Ao princípio da noite todos iam ao enterro de Jesus Cristo. Lá dentro da igreja o ambiente ficava muito pesado, altares tapados de um tecido roxo,
sacrário aberto e vazio, um enorme caixão de madeira, em cima do altar era o foco central. Lá dentro jazia o corpo de Cristo, aquele que estava o ano todo no altar-mor da nossa igreja, nesta noite de Sexta-feira Santa, retiravam-no da cruz e era depositado dentro do caixão que seria transportado em procissão pelas ruas da aldeia. A procissão saía da igreja e entrava na Rua da Ladeirinha, seguia pela Rua da Moita, descia pela Rua da Tapadinha e ao chegar à Rua da Fonte, voltavam em direcção à Torrinha, Rua de Baixo e entravam na igreja. Tudo nestas cerimónias eram muito tristes, as mulheres vestiam-se de roupas escuras, pretas mesmo, cobriam a cabeça com lenços e até os cânticos eram de morrer.
   Penso que a procissão parava duas ou três vezes para marcar alguns passos desta cerimónia. Numas escadas ao início da Rua da Moita, paravam o enterro e acontecia aquele doloroso encontro entre uma Mãe que vê o Filho a caminho do túmulo. Tudo era difícil e o povo sentia piedosamente aquela trágica e incompreensível morte, os homens que transportavam o caixão, tinham que descansar várias vezes com a ajuda de umas galhas de pau, dado o peso que levavam aos ombros.
   Neste dia não há missa, não se tocam os sinos. As pessoas foram avisadas pelas matracas tocadas três vezes à volta do povo.
   As pessoas saíam da igreja num silêncio assustador e sem grandes conversas recolhiam às suas casas. Ele morreu e há que respeitar!
   Em Malcata, uma aldeia muito religiosa e tradicional, obedecia piamente às orientações do senhor prior.

30.3.21

MALCATA: A PÁSCOA DAS MATRACAS E MARTÍRIOS

 

  




   Quando tenho saudades de um sítio é porque em algum momento da minha vida lá estive e vivi experiências boas e marcantes. Esta é uma das minhas crenças em acreditar que se deve voltar aos lugares onde já me senti bem.
   Malcata é para mim um desses lugares e portanto, sei que logo que possa, irei voltar. Para já e enquanto a pandemia nos condicionar as viagens e nos aprisionar em casa, resta-me apenas recordar alguns desses momentos bem vividos por terra beirã. Já que o confinamento não me deixa regressar à aldeia, faz todo o sentido partilhar aqui algumas memórias vividas noutras épocas pascais. Sabem que isto do Covid 19 está difícil de estar resolvido e nada como dar a volta por cima e aproveitar bem o tempo. Parar e reflectir sobre o Mundo, a Vida, a Morte, o Sabugal, a nossa terra, pode bem ajudar a passar o nosso tempo.
   Sei que muitos de nós estamos mortinhos para andar em total liberdade. A Páscoa este ano está a ser complicado para muitas pessoas. Entrámos na Semana Santa e tudo está parado, diferente, não se vão realizar procissões e este ano não vou com outro malcatenho percorrer as ruas da aldeia a tocar campainha.
   Mas mesmo assim, caminhamos para o domingo da Ressurreição. E o que importa é como que cada um de nós vamos viver a Páscoa. Como vamos viver hoje, este ano, a festa sem festa? A tradição já não está a ser como era e de ano para ano há sempre mudanças, mas a fé mantém-se.
   Vamos imaginar que este ano Cristo foi a Malcata celebrar a Páscoa. Que esperam que Ele diga e que Ele faça de diferente? Irá juntar-se ao coro das vozes femininas e cantar os martírios ou a encomendar as almas?
                                      
   

27.3.21

MALCATA: AI SE AS PEDRAS FALASSEM

 


   Nos últimos 16 anos, Malcata tem assistido impávida e serena a sucessivas promessas, algumas megalómanas, que não têm fim à vista.
   Os malcatenhos dizem que sabem tudo e tudo se vai passando como se nada lhes diga respeito, quem se mete nas aflições e imbróglios políticos é que se têm que se desenrascar. Continuamos com os cotovelos apoiados no parapeito da janela, vemos e ouvimos o que se vai passando, enquanto os cães ladram e a caravana vai andando.
   Há uns tempos fiquei a saber que, António, um dos primeiros presidentes da Junta de Freguesia de Malcata, meteu as mãos na massa e de forma apaixonada, combativa, mostrando grande vontade, conseguiu mobilizar todo o povo na defesa dos interesses da freguesia e sem medo de vozes do contra, mesmo da Câmara Municipal, conseguiu que a aldeia passasse a ter uma fonte e com duas bicas a jorrar água.
   Olhando para a nossa freguesia, seja em que ponto for, deparo-me com situações já esquecidas, outras mal explicadas e outras ainda que explicadas, parecem ter interesses um pouco estranhos e duvidosos, mas como satisfazem as carências de quem necessita de ter determinadas coisas e serviços, acabam por aceitar a ajuda e entram no jogo. Aqui nesta terra, quem tem um olho de esperteza, torna-se facilmente num rei que só olha para o que pode ganhar e aposta forte na falta de memória e discernimento do cidadão comum.
   Estamos muito próximos das eleições autárquicas. Um povo sem medo, sem vergonha de qualquer espécie, deve exigir aos partidos políticos, que escolham aqueles cidadãos que acrescentem e não diminuam a freguesia.
   Recuar 20 anos é lembrar promessas, projectos ambiciosos e porta bandeira dos políticos e que nunca saíram dos gabinetes. Já nos basta! Mas vou lembrar alguns:
a barragem e a construção do açude, o Ofélia Club, em que, ao contrário do que nos disseram, não foi a distância em metros da água, a que devia ficar o “hospital” , porque o pedido da alteração da distância foi aprovado e a obra não se fez; os terrenos estão hoje na posse da Câmara Municipal e nunca mais se falou do assunto; o Núcleo Identitário de Malcata, há uma dezena de anos que o povo espera poder visitar e recordar tempos passados, objectos e memórias que se estão a perder;  as indefinições quanto ao antigo quartel, o abafado e silenciado Centro Interpretativo do Lince, tanto segredo estão a fazer e que não compreendo; e o alargamento daquela rua principal, quando acontece? E as cabras lá para a serra? A Exploração Caprina está a mexer, pelo menos no número de ajustes directos e em euros. Algum cidadão comum de Malcata, tirando os membros da junta, viu o projecto e os pormenores da obra? Já disseram como vai ser gerido e por quem?
    E se não bastasse, dou-vos a saber que, ainda este mês, no passado dia 17 de Março, a Freguesia de Malcata foi tema de uma Aula Aberta na Universidade da Beira Interior, na cidade da Covilhã. O silêncio incompreensível, da participação da nossa freguesia, com participação directa do senhor presidente da Junta, e a participação directa de uma associação com sede na freguesia, que naquele dia celebraram o lançamento de uma publicação de enorme qualidade e valor, fruto de um protocolo de colaboração com a Universidade da Beira Interior, a associação e a Freguesia de Malcata, representada  na pessoa do senhor presidente do executivo, cooperação que tem elevado o bom e o melhor das potencialidades da nossa terra, não merecesse sequer uma simples divulgação, informação à comunidade, dando conta dos frutos dessa magnífica cooperação, que a acreditar nas palavras do senhor presidente de junta, são para continuar e reforçar. A verdade é que nem uma letra encontro nas páginas oficiais da internet e redes sociais.
   A população de Malcata tem direito à informação e divulgação de todos os acontecimentos, projectos, obras, documentos...e os políticos têm que perceber que não podem continuar a governar assim. Como cidadão e malcatenho, estou cansado.

                                                                  José Nunes Martins

  

28.2.21

CARTA COM RESPOSTA

                      

    A CARTA 
   

   Bem Vindo ao blog Malcata.net ( www.aldeiademalcata.blogspot.com ) nascido em 2006 por minha vontade. 

   Não é nenhum jornal “on-line”, mas sim um blog que, desde sempre, pretende um olhar atento sobre a terra onde nasci e vivi a minha infância e sempre que posso, regresso a esse cantinho.
   Não estranhem encontrar chamadas de atenção para situações que, por diversos motivos, não são divulgadas e não têm lugar nos meios de comunicação tradicionais, acabando por cair no esquecimento dos malcatenhos que, como eu, vivemos alguns tempos distantes da nossa terra onde nascemos mas que não escolhemos.
   As palavras e as imagens são permanentes neste espaço e são dois elementos muito importantes para comunicar com os leitores. São para mim ferramentas com que gosto de trabalhar para promover uma comunicação aberta, intencional na procura de debate e troca de ideias, de pontos de vista diferentes dos meus, com plena liberdade e respeito.
   Eu sei que nem todos aprenderam a lidar com os computadores e a nova geração de ferramentas digitais. Não é que eu seja especialista em matéria digital, contudo sei que ao abrir e manter um blog, sou de opinião que se trata de um espaço aberto e nele muitos podemos expressar as nossas ideias, os nossos anseios, pontos de vista e debater todos os temas que nos despertem interesse.
   Com a utilização da internet e de algumas ferramentas digitais, podemos aceder ao Mundo Global, mesmo a partir da mesa da cozinha cá da nossa casa, seja em que canto do mundo nos encontremos.
   O Malcata.net é um espaço que procura contribuir para o desenvolvimento de massa crítica, levar a uma maior e mais transparente participação cívica e é um palco que aceita e permite dar voz aos malcatenhos que não a têm no mundo e no quotidiano do seu dia a dia e muito menos no mundo da internet .
   Por tudo o que já referi e por uma veia que nos une à mesma terra, manter e participar neste blog é para mim uma questão de cidadania participativa e uma das ferramentas mais bem conseguidas para criar relações entre pessoas, entre cidadãos e instituições, aproximar e ajudar, informar e divulgar, dar a conhecer e aceitar o conhecimento alheio e no fim, podemos ser nós mesmos, mas todos malcatenhos. Cumprimentos a todos.

                                         José Nunes Martins