O Jornal Cinco Quinas publica na sua edição "
on line" o Manifesto elaborado por cidadãos, naturais e residentes no Concelho do Sabugal.Ver aqui:
http://www.cincoquinas.com/index.php?progoption=news&do=shownew&topic=3&newid=2164
Os momentos trágicos já passaram. Muitas pessoas já esqueceram o acontecimento e alguns escreveram que os bombeiros fizeram tudo o que estava ao seu alcance e lutaram para que a tragédia fosse minimizada.
É bom que este manifesto tenha sido escrito e enviado a estas entidades oficiais. O documento vai pôr a descoberto a falta de coordenação dos serviços de protecção nacional. Quem escreve e quem assina sabe do que viveu e do que não se falou, mas que aconteceu. Quando é necessário, o cidadão pode e deve manifestar as suas preocupações. Ler este manifesto faz bem. Faça-o.
Movimento de Cidadãos
Naturais e residentes nas
Freguesias do Concelho do
Sabugal
Excelentíssimo Senhor
Ministro da Administração Interna
Ministério da Administração Interna
Praça do Comércio
1149-015 Lisboa
Assunto: Descontentamento social, relativamente à prestação das Instituições Públicas no combate ao Incêndio ocorrido entre 30 de Agosto de 2009 e 02 de Setembro de 2009, no Concelho do Sabugal.
Somos um grupo de cidadãos, naturais das freguesias do concelho do Sabugal, revoltados e indignados com a actuação das diversas corporações de bombeiros e da Protecção Civil da Guarda no combate ao incêndio supracitado. Vimos desta forma manifestar o nosso descontentamento, uma vez que é unânime a interpretação que fazemos da deficiente e, absolutamente, ineficaz actuação das entidades empenhadas e dos seus superiores e representantes.
1º
O incêndio deflagrou no dia 30/08/2009, tendo, no mesmo dia, sido dado como extinto junto da comunicação social. No entanto, instantes depois de se ter feito propaganda deste facto, o incêndio ganhava proporções de absoluto descontrolo.
2º
As atitudes criminosas serão a grande causa dos incêndios, por essa razão, não serão fáceis de evitar, mas a diminuição das consequências, não só é possível, como é, acima de tudo, uma obrigação das entidades públicas criadas para esse fim.
3º
A ausência de formação específica nesta área, não nos permite ajuizar dos desempenhos, técnicas e prioridades em relação ao trabalho de especialistas, contudo, temos legitimidade absoluta para nos insurgirmos, veementemente, contra a ausência de desempenho, a inoperância de técnicas, o abandono de prioridades e contra o desleixo, flagrante, dos homens e mulheres que para ali foram deslocados.
4º
Sob um desagrado infindo e até um constrangimento que nos fere a humildade, vemo-nos obrigados a denunciar as atitudes dos bombeiros, altamente negligenciadas e de absoluto desdém, em relação ao perigo e ao avanço horripilante que o incêndio lograva em direcção às populações, dissipando florestas, culturas, olivais, vinhas, pastagens e um sem número de recursos, que embora pobres, eram o garante do sustento de muitos populares.
5º
O nosso desagrado e protesto, não visam culpabilizar os Bombeiros e a Protecção Civil pela catástrofe natural que se desencadeou de forma não conhecida, mas visam denunciar a total ausência de esforço e de acção que, seguramente, teriam reduzido muito as consequências funestas deste incêndio.
6º
Enquanto o incêndio devorava livremente as áreas de “mata e pinhal”, como a comunicação social lhe chama, as corporações de bombeiros aguardavam, inertes, a chegada da frente de chamas, às estradas que a GNR ia interditando, sem fazerem uma única tentativa de combate no terreno, enquanto o incêndio respirava força.
7º
Mesmo nos locais onde as chamas perdiam energia enquanto abrasavam pastos e mato rasteiro, perfeitamente acessíveis, os bombeiros limitavam-se a observar, o que contrastava com a atitude brava dos populares que, indo buscar forças onde já não as havia, se estiolavam num combate desproporcional e injusto, sem medo, mas também sem forças e sem meios.
8º
O incêndio ameaçou várias populações, tendo mesmo morto animais e destruído algumas habitações. Contudo, a descoordenação ou a táctica escolhida, faziam com que o Comando das operações, parecesse ser conivente com o incêndio, em vez de, como seria de esperar, ser um inimigo afoito e disposto a enfrentá-lo.
9º
As causas dos incêndios rondam as mais diversas causas, sendo certo que o crime e a negligência grosseira, estão estreitamente ligados a elas, assim sendo, torna-se mais do que imperioso agir, tendo em conta a realidade dos factos e não apenas agir de uma forma que se sustenta em mera propaganda, sem credibilidade e sem frutos.
10º
Tendo em conta o número de horas que o incêndio se manteve activo, o número de populações que foram atingidas, os hectares de mata e floresta que foram devorados, e observando a quantidade de meios empenhados, só podemos concluir que da batalha travada entre o incêndio bruto e selvagem e o homem inteligente e socializado, uma única coisa resultou: a derrota e o esmagamento do homem.
11º
Estivemos no terreno, vimos e vivemos de perto os factos e lamentavelmente, temos que nos manifestar absolutamente desiludidos e humilhados pela prestação dos nossos Bombeiros. Sim, dizemo-lo por ser verdade, dizemo-lo porque batalhámos na frente das chamas horas a fio, porque nos vimos rodeados de dezenas de populares audazes, armados como podiam, cortando mato, abrindo caminho, cavando terra, chicoteando pastos e porque durante dias, tardes, noites e madrugadas, não tivemos connosco no terreno, na frente de fogo, uma única equipa de bombeiros, um único veículo, uma única explicação, até mesmo quando o incêndio devorava uma habitação em ruínas, acostada a outras e mesmo no centro habitacional de uma aldeia.
12º
Não nos falem de falta de acessos porque os havia numa grande parte dos locais agora queimados, não nos falem de falta de meios porque os veículos, homens e tanques se acumulavam nas estradas asfaltadas, não nos falem de exaustão porque não vimos um único soldado da paz empunhando uma pá, mas ao invés, víamo-los descontraídos, sem nada fazerem, junto das viaturas onde assistiam impávidos e serenos a um inferno que nos roubava quase tudo.
13º
A política das chefias parece-nos excessivamente preocupada em mostrar, com vocabulário técnico, aos meios de comunicação, os meios, os veículos e a vaidade dos tripulantes, mas estão muito longe de cumprir a obrigação e o papel que as populações esperam delas.
14º
As corporações empenhadas, para além de não conhecerem o terreno, não têm preparação para apear e lutar sem um canhão de água, vimo-los limitados a esperarem pela frente do incêndio, enquanto conspurcavam os locais por onde passavam com garrafas vazias, restos de reabastecimentos, embalagens vazias e também os vimos, deixarem que ele passasse por eles, sem receio, sem medo, sem desvanecer. Estamos certos que alguns destes “Soldados” deram o melhor de si, mas muitos deles, nem sequer terão precisado de lavar a farda.
15º
Queremos que fique claro que não estamos revoltados com a força da natureza e com tudo o que de mal ela poderá fazer, estamos sim, profundamente sublevados, tristes, magoados e muito desapontados com a fraca, inútil e displicente prestação dos Bombeiros. Algo de tão grave que moveu os populares de uma terra desertificada, a manifestarem o seu desapontamento da forma que acreditam que venha a ser a mais respeitada e devidamente apreciada, para que no futuro algo seja corrigido.
16º
Elaborado o presente manifesto e depois de ser tornado publico, vai o original, conjuntamente com as assinaturas dos subscritores, ser enviado a Sua Excelência o Ministro da Administração Interna, seguindo cópia autenticada, para as seguintes entidades:
-Sua Ex.ª. O Presidente da República
-Governo Civil da Guarda
-Autoridade Nacional da Protecção Civil
-Presidente da Câmara Municipal do Sabugal
-Presidente da corporação de Bombeiros do Sabugal
- Provedor de Justiça.
Com os Melhores Cumprimentos