9.10.14

ESCLARECIMENTOS SOBRE A FESTA DE MALCATA

Alguns esclarecimentos dos mordomos sobre as festas de Malcata deste ano:
"Agora que há muitos ressentimentos e incertezas ligados aos anúncios do padre, e para completar o que foi dito na igreja e para ser o mais transparente possível, decidimos fazer um comunicado sobre a atribuição dos fundos.
Primeiro façamos um ponto da situação. A festa foi integralmente financiada pelos habitantes de Malcata. Hoje, a maioria dos fundos (75%) provêm de França e maioritariamente de pessoas com idades entre os 45 e os 70 anos. Por outro lado, mesmo se há algumas pessoas entre 30 e 45 anos para quem a festa tem importância. Infelizmente, podemos constatar que uma vez que as pessoas entre os 45 e 70 anos tenham partido, a maioria do financiamento estará perdido.
Além do mais, ficamos admirados por ver que havia muito poucas coisas nos locais destinados à festa (pouca loiça, falta de arranjo, falta de ferramentas, de instalações elétricas…).
Isto leva-nos a uma constante, se o financiamento e a organização da festa não mudarem, daqui a alguns anos não haverá fundos para o seu financiamento.
Foi partindo desta constante que organizamos a festa de 2014. Tivemos por ambição três coisas:
·         Abranger todas as idades
Atividades propostas para todas as idades
Passagens pelo Lar sempre que possível
Criação de um site facebook dedicado à festa, utilização das redes sociais
·         Sustentar a festa
Compra e recuperação de materiais de decoração que fiquem para o futuro
Criação de um quadro elétrico que fique para o futuro
Compra e recuperação de ferramentas que fiquem para o futuro
Compra e recuperação de loiça que fique para o futuro
Recuperação de numerosos materiais elétricos que fiquem para o futuro
Criação de um lavatório que fique para o futuro
Substituição de balcões do bar
Procura de patrocinadores (doação em dinheiro ou em material)
Procura de novos modos de financiamento
Criação de um dossier completo sobre a nossa festa (contabilidade detalhada, inventário, moradas úteis, contatos úteis, ...) entregue aos próximos membros da comissão de festas de 2015
·         Ser digno e respeitador do dinheiro dado pelos habitantes de Malcata
Nenhuma das nossas refeições foi paga com o dinheiro da comissão de festas
Todos os km percorridos em França foram feitos voluntariamente (mais de 8.000 km) sem pagamento de gasolina com dinheiro da festa
Investimento dos mordomos
Respeito da palavra dos habitantes na escolha de não dar nada à igreja para além dos santos comprados para o presépio de natal
Doação ao Lar ou à Associação dos excedentes de bebidas
A festa de 2014 custou cerca de 37.500 €
Uma vez pagas todas as faturas, beneficiamos de cerca de 2.650 € (em relação ao ano passado em que recebemos 1.230 €)
Decidimos repartir o dinheiro da seguinte maneira:
·         1.000 € dada à Junta de Freguesia de Malcata, unicamente para a compra das casas atualmente utilizadas para a festa
·         O restante será integralmente dado aos organizadores da festa 2015

A compra e a renovação destas casas é um meio eficaz de manter a festa e é uma coisa que nos é querida. Se a compra destas casas não se faz por este preço, será então em benefício dos mordomos de 2015 ".

Este esclarecimento foi retirado da página que a comissão de festas de 2014 teve e tem ainda, no Facebook, cujo link é este:
https://www.facebook.com/malcata.malcata?fref=nf

23.9.14

LIBERDADE DE VIVER




  Desde que o lar de Malcata abriu as suas portas já acolheu muitos idosos. Sabemos que a população da nossa aldeia está envelhecida e são poucas as crianças nascidas nestes últimos anos. São tão poucas que a escola primária já está encerrada e a creche continua também de portas fechadas.
   Afinal, quantos idosos vivem em Malcata?
   Quantos vivem nas suas casas?
   Quantos deles optaram livremente para irem viver para o lar de Malcata?
   E quantos lá se encontram empurrados pela família ?
   Dos idosos que ainda permanecem nas suas casas, quantos são apoiados pelo lar? E o apoio que o lar lhes oferece é o suficiente, é o que eles realmente necessitam?
   São muitas perguntas que me preocupam nestes últimos tempos. Espaço no lar da aldeia é coisa que parece não faltar. Se faltava espaço e as condições não eram as melhores, com a construção do novo pólo que está prestes a ser aberto, as melhorias das condições para os nossos idosos vão melhorar substancialmente.
   Olhando para os velhinhos é fácil entender que já têm muitos anos de vida, as rugas do rosto, as mãos calejadas, o andar meio encurvado são sinais que nos indicam que estas pessoas já vivem há muitos anos e agora sentem-se cansados.
   Os idosos são pessoas com muitos anos de vida, mas continuam pessoas adultas com capacidade de tomar decisões por eles próprios, como o que querem ou não fazer hoje e amanhã. São ainda donos das suas vidas, quer queiramos quer não, quer gostemos ou não das suas decisões.
   Acontece muitas vezes e até acredito que seja com boas intenções, a família intrometer-se na vida dos idosos. Os familiares não se dão conta que, às vezes, estão a pisar o risco, estão a violar a vontade própria do idoso e a sua autodeterminação, a sua vontade própria de poder gerir a sua vida, as suas coisas, o seu património, em resumo, a sua vida.
   Tanto a família mais próxima como os profissionais de saúde, desde os que trabalham nos hospitais aos que cuidam dos idosos nos lares, por vezes esquecem-se que estas pessoas, apesar de idosas, têm direitos. Todas estas pessoas não estarão a interferir demasiado na vida do idoso e nas suas escolhas de vida?
   Quantos idosos entram nos lares mesmo contra a sua vontade? E quantas famílias os vão lá retirar à força, contra a vontade deles?
   Esta é uma realidade que se vive em muitos lares, em muitas famílias e Malcata não deve ser diferente. A maior parte de nós acreditamos que os idosos, a partir de certa idade, ficam sem capacidade para tomar as suas decisões quanto à sua vida. Muitas vezes o idoso pede ajuda porque o neto ou netos o querem meter no lar, mesmo contra a sua vontade. Ou outras vezes, são os filhos do idoso que por causa da falta de trabalho, sentem-se quase obrigados a retirar o seu pai ou a sua mãe do lar, mesmo contra a sua vontade.
   Isto é violência da autodeterminação, é violência económica e se lhe juntarmos a violência emocional, temos à nossa frente um grave problema para resolver. E a solução é difícil de encontrar porque os idosos têm medo de muitas coisas: têm medo e não querem denunciar os abusos da família, da direcção do lar e dos seus funcionários. Apesar dos idosos se sentirem mal tratados e incompreendidos, vivem tristes e sofrem em silêncio porque têm vergonha de denunciar o que se passa com eles ou do que vêem ao seu redor. Ficam com medo de sofrerem represálias por parte daqueles que deles cuidam. E muitas vezes, até têm medo de serem acusados de serem eles os responsáveis pela situação por que estão a passar e acham que o melhor é calar, não dizer nada e sem querer continuam a viver numa permanente tensão. Só que estas atitudes e a aceitação destas situações, com o passar do tempo, começam por ter perturbações no sono e deixam de dormir tranquilamente, estão em constante nervosismo interior, quase com sentimento de raiva. Agindo desta forma, estão criadas as condições para o aparecimento de variadas doenças.
   O que fazer então?
   A instituição e os seus responsáveis e todos os seus colaboradores devem prestar sempre atenção a este tipo de comportamento. Detectadas as situações, há medidas que devem ser postas em prática.
   Outra acção a ser levada a cabo é que os idosos peçam ajuda e apoio. Aqueles que ainda estão de perfeita saúde e com plenas capacidades de tomar decisões, no fundo, que apesar da idade avançada, possuem uma vivência e uma independência íntegra e total, devem ajudar aquele que já não está na mesma situação. Ajudar ou pedir ajuda à instituição ou a algum cuidador em quem confie é um início. Se essa ajuda não existir, existem outros apoios externos e que os idosos podem e devem saber que existem e que estão prontos a ajudar a resolver o seu problema.
   Deixo aqui dois importantes apoios:
  
LINHA SOS PESSOA IDOSA
Telef. 800 910 100
A linha “SOS Pessoa Idosa” é um apoio feito pela Fundação Bissaya Barreto, para prevenir a violência contra pessoas idosas.
Abusos de dinheiro e atentados à autodeterminação, como o direito a escolher onde viver, são atendidos.

SAÚDE 24 SÉNIOR
Telef.808 242 424
Serviço telefónico gratuito do Ministério da Saúde. Os enfermeiros, após receber a chamada do idoso, contactam o idoso que quer ser acompanhado.


  

21.9.14

OS PREÇOS DA FESTA







  A festa de Malcata tem que ser forte e melhor que a do ano anterior. E festa não é festa sem banda de música, sem  procissão seguida de Missa Solene, Ramo e bailarico.
   Todos os anos os mordomos querem superar a comissão do ano passado. Para isso procuram apresentar programas diferentes, com realizações surpresa e não se poupam em realizar peditórios rua a rua, porta a porta, seja na aldeia ou nos arredores de Paris.
   O mês de Agosto ainda é o mês em que os emigrantes vêm à festa da sua terra. Eles vivem e trabalham lá longe, mas a vinda a Malcata, só o fazem com a condição que no segundo domingo de Agosto, haja festa.
   Hoje ser mordomo é uma demonstração de maturidade, de vitória e também de algum poder. Qualquer mordomia sabe que a participação dos emigrantes nas comissões de festas, pode significar o êxito da festa que vai organizar. E os emigrantes também sabem que é assim mesmo, sem a participação deles, a festa não tem dimensão e espectacularidade para encher o olho às pessoas.
   É por isso, pela importância que têm, que os emigrantes vêm todos os anos à festa.
   Mas, já alguém se perguntou qual o preço da festa de Malcata? E o programa da festa como é pensado? A componente religiosa não há muito a pensar, pois todos os anos se repete o mesmo. No Domingo da festa, antes da Missa Solene, sai a procissão com os santos da igreja. Cada um vai no seu andor e cada andor é levado com devoção e como testemunho público da religiosidade e fé cristã.
   Mas será que as pessoas vêm à festa só pela procissão e pela missa? Vêm de tão distante para durante uma semana mostrarem que ainda são religiosos, que vão à igreja e vivem os valores cristãos?
   Quanto aos emigrantes podemos distinguir dois grupos: aqueles que foram para França nos anos 60 e 70 e aqueles que lá nasceram ou chegaram nos anos 80 e 90. Os emigrantes do primeiro grupo são constituídos por pessoas que partiram para França para ganhar dinheiro, muito mais dinheiro. Partiram e voltam sempre. Não abandonaram a aldeia, simplesmente sentiram necessidade de partir em busca de melhor vida, uns até foram para fugir à chamada para a guerra colonial e ao regime político então em vigor.
   Outras razões e outras formas de ver a vida tiveram aqueles que partiram nos anos 80 e 90. Vivem em França, têm as suas próprias moradias, ao contrário dos seus pais ou familiares, que habitaram nos bairros de lata que rodeavam Paris. Muitos já têm filhos e casaram com pessoas francesas ou portuguesas, mas nascidas noutras terras que não Malcata. E por França irão permanecer até que os filhos terminem os estudos e acabem por lá ficar a trabalhar.
   É deste segundo grupo que agora estão a sair os mordomos. A festa serve, então, para deixar pais e mães cheias de orgulho e é um testemunho da passagem das tradições e costumes que noutros tempos também os seus avós partilharam.
   A festa de Malcata sempre teve cariz religioso, aliado a outras manifestações populares, como sejam os bailes, as bandas de música, as animações de rua, os jogos tradicionais e nestes últimos anos acaba com lanche/jantar de porco para todo o povo.
   Alguém imagina como era a vida em Malcata há 30 ou 40 anos? Estamos a recuar até 1974…1994! Lembram-se das queixas das pessoas quando a luz eléctrica ia abaixo? E o tempo era preciso esperar até os electricistas chegavam do Sabugal a Malcata, para abrirem a cabine da luz, na Fonte Velha e com um simples fio de cobre bem colocado no porta fusíveis voltava a música, as luzes do arraial e os conjuntos reiniciavam as actuações. Parece muito estranho, mas não aconteceu assim há tantos anos. Hoje graças ao reforço da rede eléctrica, essas situações são raras e no Rossio há electricidade para aguentar qualquer aparelhagem de som.
   Hoje como no passado, a festa continua a ser festa e o povo é disso que gosta. E hoje como no passado, ainda não houve mordomia que apresentasse as contas em suporte escrito ou digital, indo para além do aviso feito pelo pároco da nossa comunidade. Até quando?

17.9.14

FESTA RELIGIOSA E DIVERTIMENTOS PROFANOS

As Festas de Malcata são, muito provavelmente, o momento mais alto e mais popular do ano que se realiza na nossa aldeia. Não sei se ao longo da história da paróquia a Festa terá sido celebrada como o tem sido nestes últimos anos, mas hoje o segundo domingo de Agosto, é o dia da Festa,
É uma época em que muitas pessoas estão de férias e é um excelente pretexto para o regresso dos emigrantes, à terra que os viu nascer. Tem sido uma Festa Religiosa e Não Religiosa, tendo todas as comissões de mordomos conseguido manter uma boa ligação entre as duas componentes da Festa.
E na nossa paróquia, ou se quiserem na nossa aldeia, a Festa tem sido, alternadamente, em honra de quatro Santos: Sagrado Coração de Jesus, Senhora do Rosário, Senhora dos Caminhos e São Domingos.
A Diocese da Guarda aprovou a Legislação Diocesana das Paróquias e Administração Paroquial e está em vigor. Neste documento está um capítulo que trata do Regulamento das Festas Religiosas. Ele tem como objectivo principal o dar a conhecer a todos os fiéis e párocos as orientações diocesanas quanto às festas religiosas.
Pelo que consegui apurar, todas as Dioceses possuem o seu Regulamento das Festas. Basicamente são cópias uns dos outros. Contudo, tomei a iniciativa de solicitar à Diocese da Guarda, que me facultasse o referido documento. E já me chegou, enviado pelo Padre Hugo Martins :



REGULAMENTO DAS FESTAS












   Leiam, conversem entre uns e outros. Eu tenho acompanhado os acontecimentos à distância e talvez isso me permita ter uma visão mais fria e objectiva.
   Lembro que vivemos agora num Estado laico, mesmo assim, a Igreja continua a ter um papel muito importante junto das pessoas, nomeadamente das comunidades de fiéis como Malcata, onde a Igreja tem um papel conciliador e nunca de divisão.
   Ao decidir-se alguma coisa sobre as Festas de Malcata, é necessário observar alguns detalhes e conhecer a organização das festas da nossa aldeia. Há que ter em conta as tradições que os nossos antepassados nos transmitiram e sem ir contra as normas da Diocese, encontrar um caminho que seja do agrado de povo e igreja.
   A festa religiosa é importante. E os divertimentos também. Noutros tempos, a Festa era o grande momento aguardado por todos os malcatanhos para celebrar a vida. A vontade dos homens de boa fé e as decisões que em conjunto obtiverem, vão ao encontro da vontade de Deus.








14.9.14

MALCATA 2014 - A FESTA




Há certos acontecimentos nas nossas vidas que, por serem demasiado marcantes, devem servir de exemplo e de reflexão para todos e cada um de nós.
   As Festas de verão em Malcata é um desses casos. Trata-se de um acontecimento que pela sua importância e o impacto que causa nas pessoas, ficam a fazer parte da história de Malcata.
   Tenho a certeza que já ocorreram factos durante as Festas de Malcata que marcaram quem os protagonizou e aqueles que assistiram ao seu desenvolvimento. Já sabemos, que até à década de sessenta, as festas tinham lugar na igreja e no adro. E no ano em que os mordomos decidiram mudar para o Rossio, padre e alguns paroquianos, não ficaram agradados e terá havido ali alguns desentendimentos de parte a parte.
   Há uns anos atrás, lembro-me das conversas dos mordomos acerca dos bailes e dos conjuntos de música e da recomendação que o padre Lourenço lhes fazia: os bailaricos e tudo o que não fosse de caracter religioso só podia começar no fim das pregações na igreja. Os mordomos cumpriam essa ordem do padre e o povo também acatava, apesar de alguns não gostarem lá muito, pois, muitas vezes, as cerimónias demoravam mais tempo do que o previsto e o recinto das festas estava sem ninguém, o bar não fazia dinheiro, etc.etc.
   Para que não fique dúvida nenhuma, desejo aqui deixar bem claro que este meu apontamento não visa, de forma nenhuma, atingir, maliciosa ou injustamente, o pároco actual, o Pe.Eduardo. Não é meu propósito denegrir quem quer que seja, mesmo que supostamente pudessem haver razões para tanto. O meu objectivo é tão somente levar as pessoas de Malcata, incluindo os mordomos, a uma reflexão sobre as Festas de Malcata.
   A verdade é que o senhor padre este ano tomou algumas atitudes menos correctas. Foi um erro, mas que lhe pode custar caro e que ele começou já a pagar ao ser desprezado por alguns mordomos e outras pessoas do povo. Dirão que essas pessoas que confrontaram o padre Eduardo não têm esse direito e deviam seguir o que ele lhes dizia para fazer, que a festa é da igreja, que quem manda na igreja é o padre, etc.,etc. Sejamos razoáveis e coloquemo-nos cada qual no seu lugar. Conta-se que na véspera da festa, portanto no sábado, o padre apareceu na igreja e falou com os mordomos dando indicações acerca da organização da procissão com os santos e na forma ordenada que os participantes deveriam ter em conta, ou seja, participarem na procissão caminhando em duas filas, uma de cada lado da rua, em silêncio e não junto aos andores. Outra indicação que receberam os mordomos nesse mesmo momento terá sido um pedido também feito pelo senhor padre que consistia em colocar os santos no adro da igreja enquanto decorreria a Missa Solene, obtendo mais espaço no interior do templo para permitir que mais pessoas entrassem para participar nas cerimónias. Ora este movimentar dos andores nunca se faz em Malcata e foi difícil ouvir e acatar essa ideia do padre. Se o ambiente estava crispado, piorou quando os mordomos ouviram as palavras do padre dando a entender que os santos que estavam nos andores não eram mais do que umas estátuas de madeira. Caiu o Carmo e a Trindade, entornou-se o caldo por completo. E parece que para ajudar à “missa” alguns elementos da Fábrica da Igreja apoiavam a atitude do padre Eduardo. Lá se entenderam, ou pelo que sei, os santos participaram, como sempre participaram. Ninguém os retirou da igreja para o adro, a igreja e o adro encheram-se de pessoas.

   Estamos no século XXI, dizem que vivemos num regime democrático e livre. Voltando, por instantes, aos anos 50 e 60, época da ditadura. Na nossa aldeia e nas outras, para além da ditadura, a Igreja tinha um peso enorme e isso sentia-se nas pessoas. Muitas vezes, os padres ditavam ordens, em forma de avisos, muitas vezes no final das missas dominicais, que as pessoas eram forçadas a acatar. E caso não o fizessem, eram apontadas como “rebeldes” e poderiam vir a sofrer severas penalizações impostas pelo regime político que detinha o poder e aquelas ameaças de irem para o inferno, caso desobedecessem. Viviam num ambiente do “mando, posso e quero”.
   Os mais velhos recordam que, salvo raras excepções, a Igreja Católica portuguesa, no tempo do Cardeal Cerejeira, amigo de Salazar, andava de mãos dadas com o seu Governo. Por isso, nada de surpreendente, o facto de alguns padres terem praticado excessos, cometeram certos abusos. E em Malcata, onde a maioria trabalhava na agricultura e vivia dela. Sabe Deus como, porque as dificuldades eram muitas e o trabalho era mais manual, mais à custa da força humana.
   Mas a verdade é que, apesar de pobres e por vezes passando menos bem, o povo de Malcata sempre gostou de festejos. Malcata era um povo pobre, mas alegre. Podiam as pessoas sentir-se cansadas do trabalho nos campos e mal comidas, mas as festas tinham que ser feitas. À festa de verão, novos, velhos e as crianças, não podiam faltar.
   Nesses tempos, a festa da aldeia era algo de muito importante. Hoje é difícil explicar esse sentimento aos mais novos. Apesar deles ainda virem a Malcata por altura da festa, antigamente era o maior encontro do povo. Era quase uma “obrigação” dos malcatanhos que vivem fora de Malcata virem à terra para marcar presença na festa. Tal como no passado, também hoje todos se divertem e confraternizam com os amigos e família. Ainda continua a ser o evento que mais gente traz à aldeia. No passado, vinha mais gente das aldeias mais próximas como aquelas que vinham do Meimão, das Alagoas ou da Aldeia de Santo António. Todos procuravam a diversão e conviviam uns com os outros. Reparem que nessa época as diversões eram poucas, a televisão ainda era a preto e branco e Malcata só teve luz eléctrica a partir de 1965.
   Voltando às festas de Malcata, depois da mudança do adro da igreja para o Rossio, dado o êxito obtido, os mordomos não arrepiaram caminho e o adro ficou completamente apagado das festas.  Apesar da oposição de alguns e dos avisos do Pe.Lourenço para que houvesse respeito pelas cerimónias religiosas e a constante chamada de atenção aos mordomos para que a festa no Rossio só tivesse início depois das pregações, os festejos ainda hoje lá continuam.
   Escusado será dizer que a festa deste ano correu bem. O dia amanheceu, houve a tradicional procissão com os santos à volta do povo, celebrou-se a Missa Solene e a tarde foi animada pelo Ramo, Banda de Música e à noite baile animado.

13.9.14

A FESTA DE VERÃO


   Continuamos a contar a história da Festa de Verão de Malcata. Já abordámos a alvorada, a Música, a Missa Solene e o Ramo. Então, agora vamos recordar os bailes no Rossio e o fim da festa.
Como já referimos, o adro da igreja foi o palco principal das festas até aos anos sessenta, que começaram a ter lugar no Rossio, pelo menos a parte profana da festa. E a mudança não foi lá muito pacifica, pois nem toda a gente ficou contente com a alteração feita pelos mordomos e estes não se livraram de serem criticados. O bar da festa foi montado pela primeira vez onde hoje ele tem funcionado. Lembro-me de ter sido feito com madeira e uns paus, umas tábuas largas faziam de balcão, bidões de 100 litros cheios de água e blocos de gelo serviam de “arca frigorífica”  que mantinha as bebidas frescas.
A mudança no primeiro ano foi um pouco arriscada, mas apesar das críticas, acabou por ficar.
O nosso historiador, José Rei, volta a escrever sobre as festas de Malcata, do Ramo e do Rossio:
   “Enquanto o Ramo decorria, as crianças amontoavam-se à volta do homem das amêndoas e dos santinhos de açúcar. Nas pausas do Ramo. O tocador do acordeão abrilhantava o baile. De vez enquando também tocava a Banda da Música, porque o mais importante era que o Ramo corresse bem. Pouco se dançava na tarde da Festa, ficando o baile adiado para depois da ceia.
Só a partir da década de 60 começaram a aparecer os conjuntos de música. A Música, a Banda da Música, ao por do sol abalava e todos ficavam um pouco mais tristes. Contudo, num derradeiro esforço anímico, a mocidade ainda acompanhava efusivamente a Música até ao momento da partida.
Quando os mordomos eram rijos, a festa acabava como havia começado: com foguetes, mas de lágrimas, que a pequenada tentava em vão agarrar”.


11.9.14

A FESTA DE VERÃO ( Continuação )


   A Festa de Malcata já passou, mas nós vamos continuar a falar da Festa Grande, a Festa de Verão. No anterior artigo abordámos, com a ajuda do José Rei, como se vivia a festa de Verão, a chegada da Música ( Banda Filarmónica ) e a alvorada. Depois do foguetório e da Música vem a Procissão, a Missa e o Ramo. Então vamos lá convidar novamente o nosso José Rei e ler como ele observava a Festa.

MISSA SOLENE:O GRANDE MOMENTO DA FESTA

Igreja cheia na Missa Solene


   “O momento alto da Festa acontecia com a Missa Solene, mas antes havia uma procissão, um cortejo de visível religiosidade misturado com muita vaidade. E o ar ainda cheirava a pólvora!





O RAMO, uma das maiores fontes de receitas




O Arrematador do Ramo



   "A meio da tarde acontecia o Ramo, que era feito no adro da igreja. E só na década de 1960 a parte profana da festa passou a realizar-se no Rossio. O Ramos era um momento cuidadosamente preparado pelos mordomos, pois nesse tempo, era a principal fonte de receitas para pagar as despesas contraídas. O Ramo consistia na arrematação/leilão de ofertas de diversa índole, com destaque para os doces, o pão-leve, queijos, enchidos e cabritos. E também no Ramo se misturavam religiosidade e vaidade. Uns licitavam por cumprimento de promessas e ou sentido de ajuda, outros faziam-no para mostrar riqueza. O habitual nestas situações! E os mordomos agradeciam, enquanto o arrematador de ofertas, na sua característica estratégica de incentivo à licitação, “dez escudos, uma(…), dez escudos, duas (…), dez escudos(…) quinze escudos pró Ti João Filipe, uma (…), duas (…). E a lenga lenga continuava de oferta em oferta”.....escreveu José Rei.

   Depois de ler este texto que dizer? Olho para o arrematador e vejo-o em cima da caixa de carga de uma carrinha, talvez até seja a do Ti Alberto, pois é ele a voz e o homem que sabe puxar pela oferenda e dar-lhe ainda mais valor do que o que ela realmente tem.Claro que todos sabem que quanto mais alto for a licitação, mais dinheiro entra para pagar as festas!
   Nos anos 50, 60s, o arrematador talvez subisse para cima de um carro de vacas...lá no adro da igreja!
   Nessa época, o Ramo era a principal fonte de financiamento que os mordomos tinham para pagar as despesas. Juntavam-se também as ofertas obtidas pelos mordomos durante as voltas que davam ao povoado, indo de casa em casa e de rua em rua pedir para a festa.
   Outros tempos, outras festas e que todos ansiavam por festejar!